Não é sadio, tampouco intelectual e socialmente honesto, fazer deste processo uma corrida pelo ouro, uma barganha: seja o melhor e leve o prêmio, todo seu esforço será compensado por um ganho, preferencialmente, material.
Já faz algum tempo que desconfio que o maior benefício de se propor e construir uma educação desescolarizada se dê no íntimo de nossas estruturas emocionais (e por isso acredito tanto): de que seres humanos possam atingir suas diferentes maturidades tendo a segurança de que são amados pelo que são, com todas as suas idiossincrasias, que cada particularidade é o que os torna únicos e encantadores, que estar no mundo é uma construção constante de si - construção esta sempre amorosa, por menos compreensível que seja - e que a individualidade não pode ser mensurada, não pode ser colocada à prova. Pode, apenas, como todas as coisas honestas, dignas e reais, ser experimentada, desfrutada, apreciada. E tais convicções fazem tão parte de meu ser e estar no mundo que não consigo imaginar a criação de meus filhos de outra maneira, assim também me recriando. Nisso pulsa a essência de minha contemporaneidade.
E quanto me surpreendo, externalizando estas impressões da maneira mais simplificada possível, pois só com sentimentos como um faro instintivo de que esta é a direção certa a seguir, sobrevém sentenças (ainda que não ditas) como "Mas a vida não é assim", "É bonito - como o são as utopias", e alguns insinuantes questionamentos como "E o mercado de trabalho? É preciso educar para o mercado de trabalho", "Mas e faculdade?", e a mais capciosa "Como será o futuro dessa criança?".
Senhores, não lhes posso garantir respostas certas, seria uma contradição. Pois que as respostas que a desescolarização suscita nada tem a ver com garantias materiais para a sobrevivência (sobretudo em um sistema tão decadente), mas sobretudo para questionamentos, descobertas. Que se relacionam com um sentido profundo de realização. Que permeiam a sensação de felicidade. Que inevitavelmente colocarão em cheque o status quo e fermentarão transformações sociais. Parece um contra-senso investir em algo que tangencie o imaterial? Pois são escolhas, e tão bom seria que conceitos constitucionalmente consolidados como "a dignidade da pessoa humana", a "livre manifestação do pensamento", a "livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação" fossem verdadeiramente existentes na educação brasileira (é desta que posso falar, por ora) - e se em uma das maiores e melhores instituições de ensino públicas do país temos visto tanto ser feito contra estes princípios, apresentem-me boas razões para bater nessa tecla.
A imagem acima é a página de uma instituição privada de ensino superior, que realiza um concurso de simulado para o Enade, visando garantir boas colocações, as mesmas que servirão como material de publicidade gratuita. Sim, o Estado cria mecanismos de avaliação quantitativa que, por sua vez, subsidiarão estatisticamente empresas do segmento comercial de formação no ensino superior: o Enade é uma estratégia indireta de marketing.
Há muitos e muitos textos falando sobre educação e desescolarização (ainda que não utilizem diretamente este nome), seguem abaixo alguns muito queridos, elucidativos. E uma palestra muito especial de Viviane Mosé. Que consoam, mas cujo significado real pode ser compreendido apenas na prática. Boa leitura - e boas experiências.
RIZOMA E EDUCAÇÃO: CONTRIBUIÇÕES DE DELEUZE E GUATTARI. Mauro Michel El Khouri – Universidade Federal do Ceará
Ivan Illich - Sociedade sem Escolas
Ivan Illich - O Direito ao Desemprego Criador
Humberto Maturana - Emoções e linguagem na educação e na política
Alfabetização Ecológica: Preparando o terreno
Alfabetização Ecológica: a educação das crianças para um mundo sustentável
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